Um
amor especial
Quando Jéssica veio ao mundo, trazia a cabeça amassada e
os traços deformados, devido ao parto difícil vivido por sua
mãe.
Todos a olhavam e faziam careta, dizendo que ela se parecia
com um jogador de futebol americano espancado.
Todos tinham a mesma reação, menos a sua avó.
Quando a
viu, a tomou nos braços, e seus olhos brilharam.
Olhou para aquele bebê, sua primeira netinha
e, emocionada, falou: "linda."
No transcorrer do desenvolvimento daquela sua primeira
netinha, ela estaria sempre presente.
E um amor mútuo, profundo, passou a ser compartilhado.
Quando a avó recebeu o diagnóstico, anos depois, de mal de
Alzheimer, toda a família se tornou especialista no assunto.
Parecia que, aos poucos, ela ia
se despedindo. Ou eles a estavam perdendo.
Começou a falar em fragmentos.
Depois, o número de
palavras foi ficando sempre menor, até não dizer mais nada.
Uma semana antes de morrer, seu corpo perdeu todas as
funções vitais e ela foi removida, a conselho médico, para
uma clínica de doentes terminais.
Jéssica insistiu para ir vê-la e seus pais a levaram.
Ela entrou
no quarto onde a avó nana estava e a viu sentada em uma enorme poltrona, ao lado da
cama.
O corpo estava encurvado, os olhos fechados e a boca aberta,
mole. A morfina a mantinha adormecida.
Lentamente, Jéssica se sentou à sua frente. Tomou a sua mão
esquerda e a segurou.
Afastou daquele rosto amado uma mecha de cabelos brancos
e ficou ali, sentada, sem se mover, incapaz de dizer coisa
alguma.
Desejava falar, mas a tristeza que a dominava era tamanha,
que não a conseguia controlar. Então, aconteceu...
A mão da avó foi se fechando em torno da mão da neta,
apertando mais e mais.
O que parecia ser um pequeno gemido se transformou em um
som, e de sua boca saiu uma palavra: "Jéssica."
A garota tremeu. O seu nome. A avó tinha 4 filhos, 2 genros, uma nora e seis
netos. Como ela sabia que era ela?
Naquele momento, a impressão que Jéssica teve foi que um
filme era exibido em sua cabeça.
Viu e reviu sua avó nos 14 recitais de dança em que ela se
apresentou.
Viu-a sapateando na cozinha, com ela. Brincando com os
netos, enquanto os demais adultos faziam a ceia na sala grande.
Viu-a, sentada ao seu lado, no natal, admirando a árvore
decorada com enfeites luminosos.
Então Jéssica olhou para ela, ali, e vendo em que se
transformara aquela mulher, chorou.
Deu-se conta que ela não assistiria, no corpo, ao seu último
recital de dança, nem voltaria a torcer com ela pelo seu time
de futebol.
Nunca mais poderia se sentar a seu lado, para admirar a
árvore de natal.
Não
a veria toda arrumada para o baile de sua formatura, ao final daquele ano.
Não estaria presente no seu casamento, nem quando seu
primeiro filho nascesse.
As lágrimas corriam abundantes pelas suas faces.
Acima de
tudo, chorava porque finalmente compreendia como a avó havia se sentido no dia em que ela
nascera.
A avó olhara através da sua aparência, enxergara lá dentro e
vira uma vida.
Então, lentamente, Jéssica soltou a mão da avó e enxugou as
lágrimas que molhavam o seu rosto.
Ficou de pé, inclinou-se para frente e a beijou.
Num sussurro, disse para a avó: "você está linda."
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Desconhecido |