Entrega
de lanche nas ruas do centro de SP - 25/07/2004
Prezados Amigos,
Gostaria de compartilhar com todos uma experiência marcante e única.
Vale a pena ler... quem sabe, depois desta mensagem, você passe a ver as
oportunidades com outros olhos.
No domingo, 25/7/2004 estava participando de um trabalho voluntário na
cidade de São Paulo, entregando lanches para moradores de rua.
Neste trabalho de doação, costumamos encontrar pessoas em situações muito
precárias, que mexem com os nossos sentimentos.
Neste dia, porém, não foi diferente. Diante de tantas situações, teve uma em
especial que me chamou muito a atenção. Foi o caso do sr. Victor.
Ao ir entregar mais um lanche, notei um senhor bem velhinho, encolhido no
canto de uma parede, com muito frio.
Ao seu lado, uma cadeira de rodas. Ele estava dormindo mas com a minha
aproximação, acabou acordando assustado.
Ele tinha um semblante calmo mas com um olhar que refletia muito medo.
Ao observa-lo melhor, percebi que uma perna estava amputada e a outra muito
atrofiada, dando a impressão de ausências das duas...
Este foi um momento muito difícil... senti um nó na garganta. Meio sem voz,
ainda me refazendo da emoção, ofereci o lanche e um pouco de água.
Ele abriu um enorme sorriso, seus olhos se encheram de água e a sua boca
soltou um sonoro e sincero obrigado.
Suas palavras tinham um sotaque diferente, logo percebi que ele não era
brasileiro.
Como tinha que continuar o meu trabalho, me despedi olhando em seus olhos e
deixando uma frase vinda do coração: 'Fique com Deus'.
Fui embora pra casa. Tentei dormir .. mas não conseguia esquecer a cena
vivida naquela noite... a todo o momento vinha a imagem daquele bom
velhinho.
No dia seguinte, a lembrança continuava muito forte. Achei que tinha que
revê-lo. Resolvi voltar a noite naquele mesmo lugar com a esperança de
encontra-lo.
Tinha a vontade de conhecer um pouco mais do histórico dele e quem sabe
poder ajuda-lo.
O lugar era próximo da famosa praça da Sé, agitada durante o dia, e
silenciosa e fria durante a noite.
Levei algumas coisas importantes como comida e agasalho. Enfim, lá estava
ele, já dormindo um sono profundo.
Cheguei bem devagar e o chamei. Ele levou um susto, novamente acordou
agitado mas logo se tranqüilizou.
Pedi desculpas por atrapalhar o sono mas que para era por um motivo
importante... Começamos a conversar e logo estabelecemos uma relação
amistosa e de confiança.
Falava um portunhol carregado, disse que era equatoriano e que já estava no
Brasil a mais de trinta anos. Seu nome era Victor Manuel Armijos Celi.
Tinha quase 79 anos e já ha muito morava na rua, mas que ainda tinha a esperança
de algum dia poder reverter esta situação delicada.
Por causa da sua idade avançada, estava confiante que poderia receber a sua
aposentadoria. E com este dinheiro reservaria um lugar em uma casa de
repouso para descansar os restos dos seus dias com dignidade.
Não que a rua não fosse um lugar digno, mas que era muito perigosa e violenta.
Aproveitando o momento, me olhou bem nos olhos e com uma dor no peito me
pediu para ajuda-lo a realizar este sonho.
Então, me entregou um documento constando todos os seus dados.
Ao ir anotando em um papel, algo me chamou a atenção para um forte detalhe - quem
sabe até pra justificar este encontro - percebi que a data da chegada dele
no Brasil era exatamente a mesma data do meu nascimento, no mesmo dia, mês e
ano.
Uma feliz coincidência ou um sinal!?!
Ali percebi que algo muito forte havia. Conversamos mais um pouco e me
despedi prometendo retornar com ajuda.
Voltando pra casa, trazia não só uma forte emoção mas principalmente a
esperança de mudar este destino.
Durante o trajeto, vim imaginado por onde começar e como fazer para
conseguir meios. Não tinha a menor idéia!!!
Foi quando resolvi escrever um e-mail relatando toda a experiência.
A partir daí, comecei a enviar para vários locais, entidades, órgãos governamentais
até pra ONU cheguei a mandar. Um dos locais mais importantes foi o
Siteamigo.
Mandei uma mensagem para o meu amigo Eduardo Chamon, responsável pelo site.
No mesmo dia, ele multiplicou a idéia para milhares de pessoas. (uma
situação muito parecida com o filme 'A Corrente do Bem').
O retorno foi rápido. Várias pessoas se sensibilizaram e muitas e se
colocaram a disposição para encontrar soluções. Cheguei a receber até um
e-mail de Toronto/Canadá oferecendo apoio. (Maria)
Na terça-feira 26/7, o Eduardo me ligou dizendo que, uma amiga - Célia,
estava vendo a possibilidade de conseguir um asilo. Mas ainda não era
concreto.
A notícia me encheu de esperança e tinha que compartilhar com o meu amigo.
Ainda neste dia, visitei o seu Victor e ao me despedir, tive a sensação que
aquela seria a última noite que ele dormiria na rua.
Já na 4ª feira, por volta das 9hs da manhã, o Eduardo me liga perguntando se
estava sentado e sem aguardar a resposta, fez uma multi-conferência com a
sra. Jacinta - responsável pelo Lar de Idosos Nossa Senhora da Conceição.
Na conversa, ela aceitou acolher o nosso Victor e que poderíamos leva-lo o
mais rápido possível para lá. Combinamos então que à noite estaríamos lá sem
falta... Com a notícia, o duro foi a agüentar a ansiedade.
Chegando à noite, eu, minha esposa Lucia , Eduardo e a Rosane (uma outra
amiga do grupo), fomos buscar o nosso convidado. Chegando lá, todos estavam
super ansiosos pra ver a reação dele. Confesso que estava morrendo de medo
de chegar lá e não encontra-lo.
Mas não deu outra, lá estava ele! Demos a notícia: falamos que a partir
daquele momento, ele já tinha uma nova casa... Hum... os olhos dele encheram
dágua, uma expressão de felicidade misturada com euforia e ansiedade... uma
sensação única! ... Mais do que depressa, começou a arrumar as suas coisas,
separando o que ia levar e o que ia deixar.
Neste momento, tinha algumas pessoas próximas a nós: uma senhora - colega do
seu Victor e duas moças garis. Elas também se contagiaram de alegria pela
cena assistida.
A colega do seu Victor a todo o momento nos fazia recomendações: 'olha,
cuida bem dele' ... 'vou sentir saudades'... 'ele é uma pessoa muito
bondosa'... 'ele merece'
Após arrumar toda a sua 'bagagem', colocamos ele no meu carro e a cadeira de
rodas no carro do Edu. Seguimos então para o nosso destino.
No carro conversamos como dois velhos amigos que se reencontram.
Chegando no local, mais uma vez me surpreendi com o meu amigo. Ele ficou
muito emocionado com a primeira impressão da Casa. E, antes de sair do
carro, começou a orar agradecendo a Deus por tudo que lhe tinha acontecido -
foi mais uma cena inesquecível pra mim!
Dona Jacinta veio nos receber e dar boas vindas ao novo hospede. Seu Victor
era pura emoção... a todo o momento, estava agradecendo pela oportunidade.
Conhecemos a Casa e o levamos para comer algo... comeu um lanche e provou
uma suculenta sobremesa (detalhe: O Edu queria por que queria comer a
sobremesa mas o seu Victor não deixou).
Seu Victor estava todo falante: dizia que estava muito feliz e ao mesmo
tempo, um pouquinho triste - Feliz pelo novo lar e triste por que iríamos
embora.
Depois que terminou a refeição, fizemos uma oração de agradecimento... E
advinha quem fez a oração: o próprio Victão!!!
Antes de irmos embora, o levamos pra cama e nos despedimos com a certeza de
voltar a vê-lo o mais breve possível.
Missão Cumprida!!!.... E como diz o slogan ' Isso tudo...Não tem preço'
abraços
Paulo
Cursino - Paulo.Cursino@tecban.com.br
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